- Que foi?
- É verdade que
você comprou um livro de colorir?
- …
- Sério, cara?
Olha, faz um tempo que eu quero falar disso. Sabe que eu sou seu
amigo, né? Estou só te dando um toque.
- Hmm, tá
bom...
- É que você é
muito infantil, véi! Não é só o negócio do livro. Lembra uma
vez que eu entrei no seu carro e tava tocando “Plunct Plact Zum”?
- Mas essa
música é muito legal! Raul Seixas, pô! - Não é esse o ponto. É que tudo que você faz é coisa de criança. Te chamei pra ir tomar uma com a galera semana passada e você não foi, né? Por quê?
- Concurso de cosplay.
- Ou seja, você
foi se vestir de super-herói no meio de um monte de nerd virgem.
Sua roupa era de quê? Homem-Aranha?
- Aranha
Escarlate...
- Tá vendo?
Coisa de criança, cara. Você já tem quase trinta! Não dá mais
pra ficar assim. O que você faz de quarta à noite, que nunca foi
no campo com a gente?
- Jogo
videogame, ué. Você também joga.
- É, mas eu
jogo Fifa. Jogo de homem. Não é essa coisa de criança que você
curte. Super Mario eu jogava quando tinha oito anos! Minecraft é
jogo que o meu filho joga, cara! Você não vê que tem um problema?
- Pode ser, sei
lá.
- Estou falando
pro seu bem. Me promete uma coisa: no próximo fim de semana você
vai agir como um adulto. Depois a gente conversa.
- Tá bom.
(…)
- Tranquilo, e
você?
- Também. Fez o
que a gente combinou? - Fiz. Agi como um adulto esse fim de semana todo.
- E aí? Como foi?
- Bom, no sábado
eu fui ao estádio, como você sempre fala. Me vesti de jogador de
futebol, paguei caro, usei um banheiro muito sujo e fiquei no meio
de um monte de adultos que passaram duas horas xingando outros
adultos que torciam por um time diferente. Alguns foram brigar
depois do jogo, mas não deu pra eu ir, porque tinha combinado uma
balada. Fui a um bar muito cheio, em que mal dava pra se mexer, ouvi
músicas com letras mais adultas, como “vai no banheiro pra gente
se beijar” e “alakazam, alakazam, pode vir você e a sua irmã”;
paguei muito caro pra entrar e pra me embebedar. Aí, ofereci
tequila pra umas meninas pra ver se deixava alguma delas alcoolizada
o suficiente pra querer fazer sexo comigo. No fim não
deu certo, porque eu passei mal e acabei vomitando no banheiro.
Então eu fui embora dirigindo, mas, como eu não sou moleque, antes
eu entrei num grupo de Whatsapp que avisa onde tem blitz da Lei
Seca.
No domingo eu fui
almoçar com a minha família, ficamos vendo programas adultos na
TV, como Faustão e Domigo Legal. Me emocionei com as histórias de
vida das pessoas que vão ao programa da Eliana e descobri que a
única coisa que torna uma pessoa bem sucedida é a fé. Discutimos
muitos assuntos adultos sobre a vizinhança, criticamos as pessoas
que bebem demais e perdem o controle e essa juventude que não tem
mais respeito pelas tradições. Ficou evidente pra todo mundo que
na nossa época é que era bom, porque a gente podia fumar em
elevador e fazer piada de preto e de loira à vontade.
À noite, só me
restou mesmo ver no Fantástico como o PT está acabando com o país
e depois compartilhar umas imagens pelo Facebook expondo toda minha
indignação. Fui dormir me sentindo muito mais maduro. Obrigado
pelo toque, mudou minha vida.
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